O ciclo de queda do juro básico (Selic) da economia, iniciado há nove meses, tem provocado mudanças sensíveis nas carteiras de investimento de renda fixa. Segundo dados do Tesouro Direto, cada vez mais os investidores têm optado por títulos públicos atrelados à inflação. O vencimento da carteira também mudou: boa parte dos papéis são acima de cinco anos.
"O investidor está mostrando que acompanha as notícias e entende o que está acontecendo. Ele enxerga que a queda do juro pode levar a uma pressão inflacionária", afirma o diretor da Título Corretora, Amerson Magalhães.
No último relatório do Tesouro, de abril de 2012, 64,2% das vendas foram de títulos atrelados à inflação, porcentual que era de apenas 49,91% em abril de 2011. Esses títulos rendem um juro prefixado mais a variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Assim, em um cenário de alta de inflação, os papéis têm retorno maior.
Segundo especialistas, porém, não foi somente a busca por proteção que levou a essa corrida pelo título. O ganho que esses papéis ofereciam no começo do ciclo de queda do juro era alto. "Os investidores rapidamente perceberam que o juro real (juro menos inflação) ia cair e procuraram investimentos que ainda tinham alguma prêmio", comenta o diretor da Rico (home broker da Octo Investimentos), Ricardo da Costa de Moraes Filho.
Em maio do ano passado, a Nota do Tesouro Nacional, série B (NTN-B) com vencimento em agosto de 2020 tinha retorno de 6,31% mais IPCA - taxa que, na sexta-feira, estava em 4,26%.
"Antes, a política econômica estava focada totalmente no controle da inflação. Atualmente, é um combinado de três vetores: inflação, atividade econômica e taxa cambial", diz o consultor Sílvio Paixão. Em busca de um juro real baixo, que estimule a atividade, o governo estaria disposto a tolerar um pouco de inflação.
Opção. Em contrapartida, a demanda por papéis prefixados e pós-fixados que acompanham a Selic caiu. Mas para Ricardo, da Rico, combinar títulos inflacionários com prefixados é uma boa opção para não ficar totalmente dependente de um cenário de alta de preços. "Se a inflação não subir, os prefixados garantirão uma boa rentabilidade."
A mudança de demanda por títulos também fez alterar o vencimento da carteira. Em abril do ano passado, 19,1% das vendas eram de títulos acima de cinco anos. Atualmente, papéis com mais de cinco anos de vencimento já representam 56,8% das vendas.
O processo é natural, uma vez que papéis inflacionários têm vencimentos mais longos. Paixão lembra que a mudança só traz ganhos em termos de rentabilidade, já que o Imposto de Renda cai com o passar do tempo, chegando a taxa mínima de 15% acima de dois anos de aplicação.
O grande risco de título atrelado à inflação é o cenário não se comportar como o investidor espera. Nesse sentido, há duas possibilidades: "O juro cair ou não ter inflação tão alta", diz Magalhães, da Título. Em uma alta da taxa Selic, o investidor estará posicionado em uma taxa baixa, hoje em torno de 3%.
Popularização. O número de investidores pessoa física no Tesouro Direto bateu 300 mil pessoas em maio, carteira que representa 0,2% do total da dívida do governo. Mas o objetivo é popularizar ainda mais a aplicação.
Na sexta-feira, foram anunciadas novas funcionalidades no site do Tesouro e a diminuição dos custos de operação. O investidor poderá fazer compras programadas, reinvestir automaticamente os juros pagos semestralmente e agendar vendas.
Se o investidor comprar via agendamento, na terceira compra a taxa cobrada pela operação vai cair dos atuais 0,10% para 0,05% do valor da aplicação. O reinvestimento do juro semestral será isento de taxa.
"Nesse cenário de juros baixos, teremos menos custos na operação", informou o secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin. A parcela de compra dos títulos foi diminuída de 20% para 10%, com valor mínimo de aplicação de R$ 30.