TST aponta assédio moral contra mulher e revela descaso de bancos
06/11/12
So o título "A mulher e o assédio moral", o Tribunal Superior do
Trabalho (TST) publicou no domingo (4) uma longa reportagem no site da
instituição, revelando diversas ocorrências julgadas e apontando o
descaso de bancos que foram condenados a pagar indenizações.
Confira a íntegra da matéria:
A mulher e o assédio moral
De acordo com o ranking anual elaborado e divulgado recentemente pelo
Fórum Econômico Mundial, o Brasil saltou de 82º para 62º lugar em se
tratando de redução de desigualdade de gêneros. Tanto a Constituição
Federal brasileira quanto a legislação infraconstitucional -
trabalhista, eleitoral, civil e penal - trazem diversos dispositivos de
proteção à mulher.Mas será que nosso conjunto de leis tem sido suficiente para impedir que
milhares de mulheres que vêm conquistando mais espaço no mundo do
trabalho sejam tratadas de forma discriminatória, humilhante e muitas
vezes doentia?Diariamente juízes do Trabalho de todo o país julgam processos com
pedidos de indenização por dano moral decorrente de assédio a mulheres.
Os casos vão para as páginas oficiais dos tribunais, muitos ganham
destaque nos jornais de repercussão nacional. Mas segundo os
magistrados, esses processos representam apenas a ponta do iceberg do
grande problema trabalhista contemporâneo: o assédio.
Um fato isolado não é suficiente para a caracterização do assédio moral,
como uma situação de humilhação imposta ao empregado, mas que tenha
ocorrido uma única vez. Para ser caracterizado como assédio moral é
preciso que ocorra de forma constante e repetitiva, com o intuito de
humilhar, diminuir, acarretando o isolamento do empregado e ainda
redução na sua autoestima. Para a desembargadora, jurista e professora Alice Monteiro de Barros, o
que caracteriza o assédio moral é a intensidade da violência
psicológica, o prolongamento no tempo, o objetivo de ocasionar dano
psíquico ou moral com o intuito de marginalizar o assediado, e que se
produzam efetivamente os danos psíquicos."Como violência psicológica que é, o assédio moral atenta contra a
honra, a vida privada, a imagem e a intimidade do agredido, e outros
direitos fundamentais, bens imateriais protegidos pela Constituição
Federal", afirma Dorotéia Silva de Azevedo, juíza titular da Vara do
Trabalho de Santo Amaro da Purificação. E ressalta que o assédio
confronta o disposto no artigo 5º, X: são invioláveis a intimidade, a
vida privada, a honra, e a imagem das pessoas, assegurado o direito a
indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.
Prova
De acordo com a vice-presidente do Tribunal Superior do Trabalho,
ministra Maria Cristina Peduzzi, a prova não é tão difícil de ser
construída, pois ao contrário do assédio sexual, ele se constitui
necessariamente de atividades continuadas. "Como é uma repetição de atos
praticados no ambiente de trabalho, eu diria, é muito simples qualquer
colega poder comprová-lo".A ministra ressalta que o assédio pode ser um ato concreto ou uma
omissão, quando por exemplo se despreza o empregado, sem lhe passar
atribuições. "Ele chega no local de trabalho e fica desestimulado,
sentindo-se improdutivo, ignorante, porque ninguém lhe dá atribuições.
Também pode ocorrer quando se passa atribuições desnecessárias e
estranhas ao contratado."
Humilhações
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho manteve a condenação
do Banco Bradesco S/A e outros para pagarem indenização de R$ 5 mil por
danos morais, pelo assédio moral sofrido por uma funcionária que era
chamada de "imprestável" pelo supervisor.Com base nos depoimentos das testemunhas, comprovou-se o assédio sofrido
pela trabalhadora, sendo, portanto, devida a indenização por danos
morais. O direito à indenização por dano moral encontra respaldo no
artigo 186 do Código Civil e art. 5º, X, da CF, bem como nos princípios
basilares da nova ordem constitucional, principalmente naqueles que
dizem respeito à proteção da dignidade humana e da valorização do
trabalho humano (art. 1º da CR/88), observou o ministro Maurício Godinho
Delgado, relator do recurso na Turma.
Em outro caso que chegou ao TST, o Banco ABN AMRO Real S/A foi condenado
porque o superior humilhava e ofendia uma funcionária perante seus
colegas ao cobrar o cumprimento das metas estabelecidas pelo banco,
chamando-a de "burra", tratamento ofensivo à dignidade inerente à
trabalhadora.
Legislação
Pelo Direito brasileiro, assédio moral que causa dano à vítima gera a
obrigação de indenizar, tendo o agressor o dever de reparar o prejuízo
causado, por meio de pagamento em dinheiro, a ser fixado pelo juiz,
destinado a reparar as consequências do ato ilícito.Referida obrigação está prevista no artigo 927, do Código Civil (aquele
que, por ato ilícito, causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo).
Contudo, essa obrigação não exclui o pagamento, pelo empregador, das
verbas trabalhistas ao empregado, quando o demitir sem justa causa.
Embora ainda não exista uma lei específica para punir a prática do
assédio moral, existem atualmente 11 projetos de lei tramitando no
Congresso Nacional sobre o tema. Um deles é o Projeto de Lei nº
2369/2003, apensado ao PL nº 6757/2010, que define, proíbe o assédio
moral, impõe o dever de indenizar e estabelece medidas preventivas e
multas. Existem ainda, leis municipais proibindo a prática do assédio
moral, aplicáveis aos servidores da administração pública local, leis
estaduais como a nº 3.921/2002 do Rio de Janeiro.
Também existem cláusulas em convenções e acordos coletivos de trabalho
dispondo sobre prevenção à prática de assédio moral nas dependências das
empresas.
Para Sônia Mascaro se o assédio moral se caracteriza pela conduta
abusiva, de natureza psicológica, feita de forma repetida e prolongada
expondo o trabalhador a situações humilhantes e constrangedoras, gerando
dano emocional e profissional, seu principal meio de prova são as
testemunhas, que podem descrever e comprovar o comportamento hostil do
agressor ou as situações que presenciaram, onde a trabalhadora foi
humilhada.
Reparação No assédio moral, existem várias formas de punição, podendo recair tanto
para o assediador, quanto para a empresa empregadora que permitiu o
ocorrido, ou até mesmo incentivou o assédio, como, por exemplo, no
assédio moral organizacional, decorrente de políticas corporativas,
explica a advogada.
O empregador responde pelos danos morais causados à vítima que sofreu
assédio em seu estabelecimento, nos termos do artigo 932 do Código
Civil. Se condenado, a Justiça do Trabalho fixará um valor de
indenização com o objetivo de reparar o dano.
Já o assediador poderá ser responsabilizado em diferentes esferas: na
penal, estará sujeito à condenação por crimes de injúria e difamação,
constrangimento e ameaça (artigos 139, 140, 146 e 147 do Código Penal);
na trabalhista correrá o risco de ser dispensado por justa causa, artigo
482 da CLT, e ainda por mau procedimento e ato lesivo à honra e à boa
fama de qualquer pessoa.
Por fim, na esfera cível, poderá sofrer ação regressiva, movida pelo
empregador que for condenado na Justiça do Trabalho ao pagamento de
indenização por danos morais, em virtude de atos cometidos pela pessoa
do empregado.
Sônia Mascaro, advogada, é grande defensora da conscientização tanto de
trabalhadores quanto de empregadores sobre o assédio moral e sexual no
ambiente de trabalho, pela convicção de que o melhor combate desse tipo
de prática não deve se dar pela via punitiva, mas pela preventiva.
Seja por meio de campanhas publicitárias de esclarecimentos dos
trabalhadores, promovidas por entidades como o Ministério Público ou a
Ordem dos advogados do Brasil (OAB) ou ainda por meio de palestras
oferecidas pelas empresas para seus empregados. "Campanhas nesse sentido
possibilitam que os trabalhadores tenham conhecimento do que é o
assédio e sejam capazes de identificar situações de abuso as quais
estejam expostos, tendo a consciência de que não devem tolerá-la, mas
sim denunciá-la", enfatiza Sônia Mascaro.
Para a advogada a conscientização também é importante nas esferas de
comando da empresa, pois seus dirigentes precisam estar atentos à
existência de condutas que possam vir a ser consideradas assédio,
"Principalmente estimulando sua sensibilidade para perceber se seus
subordinados sofrem abuso ou agem de maneira abusiva, identificando o
problema e buscando sua correção", pontua.
Como inexiste legislação específica no Brasil versando sobre o assédio
moral e sexual no trabalho e, principalmente, pelas proporções do tema
na última década e o grande número de processos na Justiça do Trabalho,
Sônia acha fundamental a regulamentação da matéria pelo meio legal. A
seu ver, a indenização é um dos pontos mais importantes que precisa ser
delineado, ante a atual discrepância em relação às condenações
realizadas pelas Varas do Trabalho e Tribunais Trabalhistas.
"Acho fundamental que esse instrumento não seja banalizado e que os
valores fixados a título de dano moral sejam não apenas reparatórios e
punitivos, mas que tenham um caráter pedagógico forte objetivando que a
empresa seja compelida a promover melhorias em seu ambiente de trabalho
para extirpar qualquer forma de assédio", conclui.
Fonte: TST