A decisão do governo de permitir oficialmente que se abata cerca de R$ 20 bilhões em desonerações tributárias do cálculo do superávit primário deste ano tem como objetivo evitar que se repita o desgaste político e de confiança ocorrido no fim de 2012, quando o Tesouro Nacional teve que lançar mão de manobras contábeis para - do ponto de vista formal - entregar o resultado fiscal dentro da meta.
Mas, além dessa discussão, cabe notar também que há limites técnico-financeiros para algumas das manobras usadas na virada do ano - a não ser que a "contabilidade criativa" do governo fique ainda mais criativa, o que tampouco pode ser descartado.
Desde 2008, ano em que estourou a crise financeira internacional, mas principalmente depois de 2009, os dividendos pagos pelas estatais passaram a cumprir um papel relevante no cômputo das receitas primárias da União. Apenas em 2012, as estatais federais pagaram R$ 28 bilhões em dividendos ao Tesouro, ante R$ 20 bilhões em 2011, R$ 22,4 bilhões em 2010, R$ 26,7 bilhões em 2009 e R$ 13,4 bilhões em 2008.
No ano passado, BNDES e Caixa Econômica Federal desembolsaram R$ 12,9 bilhões e R$ 7,7 bilhões, respectivamente, o que os fez responder, em conjunto, por 74% do total de dividendos arrecadados pelo Tesouro no exercício - maior percentual desde 2000, primeiro ano da série divulgada pelo órgão ligado à Fazenda.
A não ser que os dois bancos 100% controlados pelo governo tenham tido lucros realmente extraordinários no quarto trimestre, as cifras devem superar com certa folga o lucro obtido pelas instituições em 2012. De janeiro a setembro, o BNDES lucrou R$ 4,8 bilhões, enquanto a Caixa teve ganho líquido de R$ 4,2 bilhões.
Para comparação, a prática mais comum no Brasil é que as empresas distribuam 25% do lucro líquido ajustado (após destinação de 5% para a reserva legal). Algumas empresas em fase madura, que não precisam reter tanto lucro para crescer, pagam percentuais maiores, como companhias de cigarro, telefonia e energia. Os grandes bancos privados costumam pagar mais que os 25%, mas menos de 50%. A diferença reforça o patrimônio.
Certamente não é por falta de perspectiva ou de necessidade de crescimento que os dois bancos federais estão distribuindo uma fatia tão grande ou até maior que o resultado do exercício. Se isso fosse verdade, o governo não teria que fazer aportes de capital e de instrumentos híbridos de capital e dívida de forma seguida nessas instituições, para permitir a elevação dos empréstimos.
Cabe notar que não há restrição, a princípio, para que uma empresa pague mais de 100% do lucro de um ano na forma de dividendos. Para isso, basta que haja reserva de lucros formada nos anos anteriores. E é aí que surge o limite.
O BNDES encerrou 2011 com uma reserva de lucros total de R$ 9,3 bilhões e deve ver essa cifra cair em mais da metade ao fim de 2012 (repetindo, caso não registre ganhos extraordinários no quarto trimestre).
No caso da Caixa, se o lucro do quarto trimestre mantiver o mesmo ritmo observado até setembro, a reserva de lucros deve fechar 2012 perto de R$ 2 bilhões, metade dos R$ 4 bilhões que tinha um ano antes.
Considerando apenas os dois bancos, isso significa que o colchão de reservas formado ao longo do tempo caiu de R$ 13,3 bilhões para algo próximo de R$ 5 bilhões ou R$ 6 bilhões em um ano. Ainda deve ser suficiente para garantir mais um ano de dividendos gordos em 2013, se for necessário. Mas esse saco tem fundo, e ele está mais próximo.
Se as reservas não forem "reabastecidas" em períodos de vagas gordas - com dividendos menores que os lucros, como foi feito em alguns dos anos recentes - uma hora o dinheiro acaba.
Fonte: Valor Econômico
A decisão do governo de permitir oficialmente que se abata cerca de R$ 20 bilhões em desonerações tributárias do cálculo do superávit primário deste ano tem como objetivo evitar que se repita o desgaste político e de confiança ocorrido no fim de 2012, quando o Tesouro Nacional teve que lançar mão de manobras contábeis para - do ponto de vista formal - entregar o resultado fiscal dentro da meta.
Mas, além dessa discussão, cabe notar também que há limites técnico-financeiros para algumas das manobras usadas na virada do ano - a não ser que a "contabilidade criativa" do governo fique ainda mais criativa, o que tampouco pode ser descartado.
Desde 2008, ano em que estourou a crise financeira internacional, mas principalmente depois de 2009, os dividendos pagos pelas estatais passaram a cumprir um papel relevante no cômputo das receitas primárias da União. Apenas em 2012, as estatais federais pagaram R$ 28 bilhões em dividendos ao Tesouro, ante R$ 20 bilhões em 2011, R$ 22,4 bilhões em 2010, R$ 26,7 bilhões em 2009 e R$ 13,4 bilhões em 2008.
No ano passado, BNDES e Caixa Econômica Federal desembolsaram R$ 12,9 bilhões e R$ 7,7 bilhões, respectivamente, o que os fez responder, em conjunto, por 74% do total de dividendos arrecadados pelo Tesouro no exercício - maior percentual desde 2000, primeiro ano da série divulgada pelo órgão ligado à Fazenda.
A não ser que os dois bancos 100% controlados pelo governo tenham tido lucros realmente extraordinários no quarto trimestre, as cifras devem superar com certa folga o lucro obtido pelas instituições em 2012. De janeiro a setembro, o BNDES lucrou R$ 4,8 bilhões, enquanto a Caixa teve ganho líquido de R$ 4,2 bilhões.
Para comparação, a prática mais comum no Brasil é que as empresas distribuam 25% do lucro líquido ajustado (após destinação de 5% para a reserva legal). Algumas empresas em fase madura, que não precisam reter tanto lucro para crescer, pagam percentuais maiores, como companhias de cigarro, telefonia e energia. Os grandes bancos privados costumam pagar mais que os 25%, mas menos de 50%. A diferença reforça o patrimônio.
Certamente não é por falta de perspectiva ou de necessidade de crescimento que os dois bancos federais estão distribuindo uma fatia tão grande ou até maior que o resultado do exercício. Se isso fosse verdade, o governo não teria que fazer aportes de capital e de instrumentos híbridos de capital e dívida de forma seguida nessas instituições, para permitir a elevação dos empréstimos.
Cabe notar que não há restrição, a princípio, para que uma empresa pague mais de 100% do lucro de um ano na forma de dividendos. Para isso, basta que haja reserva de lucros formada nos anos anteriores. E é aí que surge o limite.
O BNDES encerrou 2011 com uma reserva de lucros total de R$ 9,3 bilhões e deve ver essa cifra cair em mais da metade ao fim de 2012 (repetindo, caso não registre ganhos extraordinários no quarto trimestre).
No caso da Caixa, se o lucro do quarto trimestre mantiver o mesmo ritmo observado até setembro, a reserva de lucros deve fechar 2012 perto de R$ 2 bilhões, metade dos R$ 4 bilhões que tinha um ano antes.
Considerando apenas os dois bancos, isso significa que o colchão de reservas formado ao longo do tempo caiu de R$ 13,3 bilhões para algo próximo de R$ 5 bilhões ou R$ 6 bilhões em um ano. Ainda deve ser suficiente para garantir mais um ano de dividendos gordos em 2013, se for necessário. Mas esse saco tem fundo, e ele está mais próximo.
Se as reservas não forem "reabastecidas" em períodos de vagas gordas - com dividendos menores que os lucros, como foi feito em alguns dos anos recentes - uma hora o dinheiro acaba.
Fonte: Valor Econômico