O pomposo título dessas mal traçadas linhas pode iludir que aqui serão tocadas questões fundamentais acerca da dominação abstrata, impessoal e quase objetiva do sistema do capital sobre os complexos sociais. Em verdade não pretendemos nem sequer penetrar introdutoriamente neste amplo campo, apenas apontaremos algumas inferências aparentemente naturais que o modo de produção capitalista impõe instrumentalmente às pessoas na esfera da academia e do "universo organizacional".
Quiçá as maiores falácias introduzidas pela ideologia burguesa nos últimos tempos é a profusão dos fetiches do "pleno emprego" e do "desenvolvimento sustentável" . Tais discursos invadiram os espaços universitários transpondo as fronteiras do universo empresarial. Em verdade, Tais mitos estão presentes deveras nas pratilheiras das consultorias empresarias como uma indumentária necessária para justificar a concorrência capitalista (imperfeita) e a exploração das economias centrais sobre a periferia do sistema, bem como para justificar a dominação da esfera do mercado como espaço intransponível, confirmando a inevitabilidade das hierarquias sociais. Evidente, como quase todo postulado da intelligentsia burguesa, as formulações sobre o "desenvolvimento sustentável", o "pleno emprego" e a "participação nos lucros" são insuficientes teoricamente, não suportando uma mínima prova de validade empírica palpável.
Faz-se mister destacar que o "indivíduo social", no âmbito do metabolismo sistêmico do capitalismo, desenvolve-se em sintonia com a dinâmica da contradição em processo do capital, desfazendo quaisquer ilusões de justas distribuições de parcelas da mais-valia produzida (lucros) entre patrões e empregados. Ou seja, a negação do trabalho vivo como fonte da reprodução ampliada lucros é imanente ao sistema do capital. Marx bem definiu que somente com a superação do modo de produção vigente e das relações sociais que se desenvolvem sob seu domínio será possível o salto para a genuína história dos homens, livre dos fetiches (ilusões). Contudo para o filósofo Marx, para quem o socialismo viria como corolário do desenvolvimento pleno do metabolismo do capital e seu subseqüente esgotamento como instrumento de perpetuação das forças produtivas, a formação fraternal-solidária brotaria como uma renovação metabólica necessária para a própria perpetuação da própria humanidade. A historiografia parece comprovar que quem tentou (etenta) outros atalhos para o socialismo - ou mesmo para humanizar o capital - não obteve o êxito esperado. Os exemplos mais recentes de tais equívocos foram o recente fracasso soviético e as miragens sobre o "desenvolvimento sustentável" .
Com a crescente redundância da força-de-trabalho para a produção da riqueza social, têm-se uma expansão das massas irreversivelmente condenadas à vala comum da assistência social. Noutras palavras, o desemprego estrutural é irreversível, em contraste com a falácia do "pleno emprego". Com efeito, as estratégias de confronto individual para a sobrevivência no âmbito do mundo das mercadorias se tornam progressivamente inviáveis. A apropriação e a produção coletivas parecem indicar o caminho e a pedagogia possível para as comunidades alijadas do processo convencional de reprodução do capital.
Por seu turno, o aumento da produtividade do trabalho impele ao crescimento jamais presenciado da produção geral de mercadorias, decrescendo continuamente o tempo de trabalho socialmente necessário (horas de trabalho humano consumidas coletivamente) em face do avanço tecnológico.
Cabe registrar que mesmo com a emergência das possibilidades apontadas, isso não significa inferir que o capital provocará sua própria destruição.
Todavia, inescapavelmente, cria condições para tal superação. A "morte" do sistema e a emancipação humana terão que ser encaminhadas inevitavelmente pela sociedade civil, em geral, por meio dos movimentos sociais contestatórios, e pelos trabalhadores, em particular, pela luta hodierna por melhores salários e redução do consumo de força-de-trabalho, possibilitando maior tempo livre para o exercício de atividades superiores.
Uma condição necessária fundamental, conforme a sugestão aqui apontada, é a crítica radical ao sócio-metabolismo do capital como elemento-unificador das lutas sociais, mediação necessária para uma nova forma social comunal-solidária.
Júlio Ramon Teles da Ponte
Mestre em Sociologia e Funcionário do BB